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  • Writer's pictureRui Marques

Crash

Comentário breve



Poucas vezes o cinema nos terá oferecido, por um lado, um tão extraordinário exercício de interpretação da realidade complexa que vivemos nos contextos multiculturais dos nossos dias e, por outro, uma tão cristalina visão da natureza humana. COLISÃO, independentemente do veredicto dos Óscares, é - arrisco - uma obra prima, desde logo, pelo seu argumento original. Ao contrário de incursões muito maniqueístas, que abundam em filmes que cruzam as temáticas do racismo e da exclusão social, onde o bem e mal estão em continentes bem separados, esta história vai mais longe e chega ao ponto certo. Como o dissidente russo Alexander Soljenítsin, os autores do argumento (Paul Haggis e Bobby Moresco) parecem ter o mesmo ponto de partida: "Que bom seria que os homens se dividissem entre bons e maus... Encerraríamos os maus e restariam os bons. O problema é que a linha que separa o bem e o mal atravessa o coração de cada homem: e quem de nós está disposto a abdicar de metade do seu coração?"

Toda a história de COLISÃO é, acima de tudo, um rendilhado de vidas que se cruzam, revelando em diferentes momentos, as faces - mais ou menos ocultas - de cada personagem. As tensões dos encontros e desencontros com o "outro", os preconceitos que nos habitam nos contextos mais inesperados (You think you know who you are. You have no idea.), a redenção que nunca é impossível e a perfeição que nunca chega a ser eterna, são alguns dos veios que o filme desenrola. Esta leitura que nos propõe (num clima estético sofisticado, onde a música é peça fundamental) embora seja lançada em torno da ideia do toque e do choque, da distância e da diferença, é simplesmente sobre a nossa humanidade. Com ele, descobrimo-nos. E se para todos COLISÃO deveria ser de visionamento obrigatório, para quem trabalha em contextos multiculturais, com a temática da imigração e do racismo, é um referencial indispensável. Seis nomeação para os Óscares pode, muitas vezes, não querer dizer muito. Neste caso, só peca por defeito.


"It's the sense of touch. In any real city, you walk, you know? You brush past people, people bump into you. In L.A., nobody touches you. We're always behind this metal and glass. I think we miss that touch so much, that we crash into each other, just so we can feel something."
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