Chamavam-se Luis Giovani e Pedro. Desde há dias, choramos as suas mortes às mãos da violência estúpida, numa rua de Bragança ou de Lisboa. Dois seres humanos perderam a vida e isso é irreparável e de uma gravidade extrema. Lamentamos o fim dos seus sonhos comuns: o curso universitário, o gosto pela vida, a alegria de descobrir o mundo numa morte sem sentido. Qualquer que tenha sido a motivação do crime que os matou merece a nossa condenação total e absoluta. Nada justifica a morte de uma pessoa.
Sofremos com os seus pais, amigos e familiares, numa dor que nunca pode ser plenamente compreendida por quem não a viveu. Em certa medida, somos também da sua familia: a nossa família humana. Somos solidários nesta dor e no sofrimento.
Queremos que a justiça faça o seu trabalho, identificando e julgando os culpados, nos termos de um Estado de Direito, de uma forma célere, adequada e, sobretudo, justa e imparcial. Não podemos falhar, enquanto comunidade organizada num Estado, nesta etapa. É agora, já, o tempo da Justiça.
Mas temos também no nosso pensamento as famílias dos agressores que assassinaram estes dois jovens. Num sofrimento também profundo, numa frustração e sensação de fracasso e seguramente numa noite escura de perplexidade. A sua dor também é a nossa. Nenhum/a mãe/pai se deseja nessa angústia.
E as pessoas que cometeram estes crimes graves? Para quem acredita no valor sagrado da vida humana e da sua dignidade em qualquer circunstância, não esquece que também são pessoas. Não o deixaram de ser por terem cometido porventura o erro mais grave que poderiam ter feito. Devem assumir as responsabilidades num julgamento justo, com direito a uma defesa nos termos da lei. Sendo condenados, devem cumprir a pena que lhes for aplicada e, na medida do possivel, reparar o dano causado e voltar a recuperar, pelo remorso e arrependimento, a sua humanidade perdida após este gesto louco que praticaram. Também eles estão no nosso pensamento.
Finalmente, todos nós que nos pronunciamos sobre esta tragédia, não esqueçamos que a violência e ódio - expressões do mal que terminam sempre em sofrimento e dor - nas nossas palavras e nas nossas reações semeiam ventos que podem gerar maiores tempestades. Ser incendiários por estes dias é uma tentação em que muitos caem e que só trará consequências graves para o nosso futuro comum.
Neste momento, mais do que nunca, precisamos de reafirmar o caminho Ubuntu: “eu sou porque tu és/só sou pessoa através das outras pessoas”, ou dito de outra maneira, com Desmond Tutu, “a tua dor é a minha dor, o teu sofrimento é o meu sofrimento”.
Precisamos de reafirmar a dignidade inegociável de todos e qualquer ser humano. Precisamos de ser capazes de construir a paz, o que exige trabalhemos afincadamente pela justiça social, pelo respeito mutuo e pela igualdade de oportunidades, contra todas as formas de discriminação e de ofensas à dignidade humana.
Com os nossos mestres sabemos que a linha que separa o bem e o mal não divide grupos, religiões, etnias ou nações. Não estão os “bons” de um lado e os “maus” do outro. Divide o coração de cada pessoa. Temos a sombra e a luz, o amor e o ódio, dentro de nós.
Sabemos que em cada um de nós estão dois lobos, um feroz, violento e devastador, capaz do pior e outro dócil, amigo e cuidador, capaz do melhor. Nunca esqueçamos que crescerá o que mais alimentarmos. E como Ubuntus sabemos bem qual devemos alimentar.
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