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  • Writer's pictureRui Marques

Temos debates a mais e diálogos de menos…


Creio que temos sobrevalorizado o papel dos debates, face à relevância dos diálogos. Sem que isso queira dizer que não precisamos de debater (podem ter o seu lugar), tantas vezes essa abordagem só nos conduz a jogos de soma nula, em que alguém pretende “ganhar”, face a outro que deve “perder”. Como dizia Churchill, com a sua ironia fina, “o que eu espero, senhores, é que depois de um razoável período de discussão, todos concordem comigo”. E isso não nos levará muito longe.



Esta provocação irónica em torno do “nós precisamos de falar”, enquanto sinónimo de “eu quero falar e tu tens de ouvir o que tenho para te dizer”, leva-nos a uma das grandes dificuldades relacionais do nosso tempo. Na verdade, há um equivoco de base neste ponto de partida, que necessita ser revisto.


Precisamos, pois, de cultivar uma atitude muito mais aberta de verdadeiro diálogo, que se abre às diferentes partes, numa interação positiva e construtiva.


Na abordagem do Guide to Religious Dialogue”, do Kaicid Dialogue Center, evidencia-se bem algumas das diferenças essenciais entre estas duas dinâmicas. Enquanto a dinâmica de Debate nos leva para uma abordagem confrontacional, em que há o objectivo de “ganhar”, em que se defende que as assunções de que partimos são “verdades” e que se critica a outra parte, levando-nos a uma mentalidade fechada, baseada na determinação de que se “tem razão”, na abordagem de um Diálogo procura-se algo diferente e, sobretudo, com uma outra postura. No Diálogo a abordagem é colaborativa, procura-se um terreno comum, discutem-se os pressupostos de partida sem complexos e somo obrigados a pensar sobre a nossa própria posição, criando uma atitude aberta e dando espaço a que possamos estar errados e necessitemos de mudar.

Foi neste contexto que ganhou particular significado a renovada presença entre nós de Sira Abenoza, do Instituto de Diálogo Socrático, de Barcelona, que nos conduziu num seminário sobre esta metodologia, já com 2300 anos e que continua tão atual. Estamos a preparar um novo formato Ubuntu - Reconcilia - que nos projecta para processos de promoção de diálogo e construção de pontes em quadros de conflito ou pós-conflito e os contributos das aprendizagens sobre a arte de dialogar torna-se vital.


Deixou-nos dez regras para quando, em diálogo socrático, fazermos perguntas:

  1. Não ter medo do silêncio (dar tempo; dar-se tempo).

  2. Suspender o julgamento.

  3. Ser maiêutico (ajudar os outros a darem à luz as suas próprias ideias).

  4. Pensar-se em equipa com a outra parte.

  5. Escutar.

  6. Conectar-se com o seu desejo de conhecer (curiosidade).

  7. Conectar-se com a sua vontade de ajudar (benevolência).

  8. Praticar “elenchus” construtivo (questionar o que foi dito, para que se clarifique e se vá mais longe).

  9. Paciência.

  10. Evitar a arrogância.


Se quiser conhecer mais sobre o trabalho de Sira Abenoza sugiro que possa ver o documentário “In Dialogue (em inglês) que mostra uma interessante abordagem no quadro do conflito da Irlanda no Norte.



Ubuntu Reconcilia, uma nova aposta


Desde há muito que nos motivam caminhos de paz e de reconciliação. Procurar a melhor forma de reconstruir relações quebradas é um desafio grande, mas o melhor caminho possível para evitar a espiral negativa do ressentimento e do ódio.



Uma das dimensões que sempre me fascinou em relação ao processo de transição na África do Sul , do apartheid para a democracia, foi a capacidade demonstrada de desenvolver um processo de reconciliação robusto, ainda que não isento de falhas. O legado de Desmond Tutu a este propósito sempre foi uma enorme inspiração. Ouvi-lo neste vídeo ajuda-nos a entender a dimensão e a beleza da sua visão sobre reconciliação.


Assim, é natural que a Academia de Líderes Ubuntu regresse regularmente a este tema. Este mês, apresentámos um novo modelo do método Ubuntu, aplicável a processos de reconciliação, do micro ao macro, do conflito de vizinhos, ao bullying até ao post-conflito. Colaborou connosco nesse processo, Gisella de Andreis, uma facilitadora colombiana, com uma forte experiência de participação no processo de reconciliação na Colômbia, em particular com o trabalho de base comunitária. Aqui fica o seu testemunho.


Neste processo, seguir-se-á agora a fase de pilotagem, com a realização de experiências piloto em vários contextos, de diferentes países. Em 2024 estaremos prontos para disponibilizar esta ferramenta para toda a rede Ubuntu.



Ainda a memória da tragédia, com uma chave de leitura para o futuro…


Sobre os acontecimentos no Centro Ismaelita/Fundação Aga Khan, importa não esquecer a homenagem às vitimas, mas também as lições que podemos tirar para interpretar um caso como este, sem abdicar da firmeza nos princípios e nos valores.




1. Aconteceu um crime.

Perante o assassinato de duas pessoas e os ferimentos de outras três há que, em primeiro lugar, ser claro na qualificação do que se conhece. Tratou-se de um crime ignóbil, inequivocamente condenável, em qualquer circunstância, seja quem for o seu autor.

Porém também começa a ser claro - segundo a PJ - que não se tratou de um ato de terrorismo. Não havia antecedentes, sinais de radicalização, reivindicação credível do ato e nenhuma intencionalidade plausível nas vítimas a atingir.


Neste quadro, num país civilizado, só uma coisa pode acontecer: confiar na justiça, para que funcione plenamente, no respeito das regras do Estado de Direito, desde a investigação até à acusação e aplicação de uma pena justa. A justiça terá os seus tempos mas só nela e através dela se poderá afirmar a civilização.


2. Aconteceu uma tragédia.


Esta foi uma enorme tragédia. As duas vidas que se perderam eram preciosas. Como qualquer vida humana. Mas, no caso específico da Mariana e da Farana, havia este compromisso cívico de serviço aos refugiados, que torna esta tragédia ainda mais incompreensível. Neste momento, é essencial prestar homenagem ao seu legado e ao seu exemplo e ser solidário com a dor das suas famílias. E essa honra que lhes é devida passa, com certeza, por prolongarmos em nós o seu exemplo de exercício humanista.


Há também uma tragédia que se abateu sobre uma comunidade. Os ismaelitas, que deram exemplos notáveis de acolhimento e integração de refugiados, sofreram este duro golpe que seguramente os deixa perplexos. Como foi possível, para quem fazia o bem, ver isto acontecer no seu seio? É-lhes devida uma solidariedade inequívoca, expressa no respeito pelo seu trabalho e no ânimo para que continuem, sem hesitações ou desfalecimento. Finalmente, esta tragédia atinge brutalmente três crianças, que depois de terem perdido a sua mãe de uma forma horrível, veem-se agora apartados do seu pai e com um estigma associado à sua história. Cuidar destas vítimas vai ser também essencial.


3 . Uma mão cheia de interrogações.


Algo que não podemos ignorar é o muito que não sabemos sobre o que aconteceu. O que se passou na cabeça daquele homem para que fosse capaz de um ato hediondo, num quadro de uma instituição que o estava a apoiar e a cuidar dos seus filhos? Falhou algo que se poderia ter previsto e/ou prevenido? Houve sinais que não foram devidamente identificados? O que se passou verdadeiramente?


Não sabemos. E precisamos de tempo para perceber melhor o que se terá passado. Não nos podemos precipitar. É preciso dar tempo ao tempo e não fazer julgamentos infundados. As investigações que começaram irão ajudar-nos a perceber melhor. A prudência será boa conselheira e a paciência para esperar até se apurar a verdade será muito sábia.


Mas as interrogações não nascem só do que não sabemos. Também o que sabemos nos deixa perguntas. Como é possível que alguém explore estas tragédias, associadas a este crime, para fazer guerra política, sem escrúpulos, nem vergonha? Como é possível que alguém explore medos e fantasmas para se afirmar a qualquer preço? Como é possível se faça demagogia em cima do sofrimento das vítimas?


4. Firmeza nos valores, certeza nos princípios.


No meio de tempestades como esta é fundamental uma coisa: há que não hesitar um milímetro nos valores que nos movem e nos princípios que nos sustentam. Reafirmar o dever civilizacional de acolher famílias de refugiados que fogem da guerra e do horror de situações como a que se vive no Afeganistão (como noutros contextos) é essencial. Este crime e estas tragédias não nos podem abalar nos nossos valores e um episódio como este não nos deve fazer mudar o que está certo. Pelo contrário, deve-nos reforçar na determinação de continuar a lutar por um mundo mais justo e mais humano, no qual o acolhimento de quem está em situação vulnerável se inclui.



A dificuldade de escolher


Como muitos de nós, acedo a uma miríade de informação. Seja através da Internet, seja através das múltiplas plataformas de streaming de vídeo ou de áudio. E quanto mais tenho para escolher, mais difícil se torna e mais tempo desperdiço num zapping inconsequente.




Creio que vale a pena questionar a nossa (para alguns) sociedade da abundância e em que medida isso nos traz mais satisfação verdadeira.


Um artigo interessante de Iyengar & Lepper, “When choice is demotivating: can one desire too much of a good thing?” fala-nos do “paradoxo da escolha” em que quanto mais opções um consumidor tem para escolher, mais baixa a sua propensão para comprar, conceito que já havia sido desenvolvido no livro “The paradox of choice: why more is less”, de Barry Schwartz, cujas ideias base pode conhecer através desta sua conferência:


Ou se preferir uma apresentação mais gráfica, pode escolher este vídeo:


Esta imagem ajuda-nos também a perceber melhor este fenómeno em que creio ser óbvio que esta é mais uma razão para nos repensarmos, em termos de estilos de vida e de ambição de tudo ter, e uma boa notícia para a causa da sustentabilidade. Daqui decorrem impactos não só para cada um de nós, mas também para partilhar com os mais novos, nomeadamente nos nossos ecossistemas educativos.



Pessoas que nos marcaram…


A vida vai-me proporcionando o enorme privilégio de conhecer pessoas extraordinárias. Umas que são perfeitos anónimos e que poucos conhecem e outros que se tornaram figuras públicas com grande destaque global. Todas elas imperfeitas, todas elas notáveis. Entre estas, marcou-me significativamente o ter tido oportunidade de conhecer Kaylash Sathyarti, Prémio Nobel da Paz 2014.



O facto de ter recebido o Prémio Nobel da Paz no mesmo ano de Malala ofuscou-o do conhecimento público. Este indiano, de 69 anos, tem desenvolvido um trabalho notável no combate ao trabalho infantil e na defesa do direito universal à educação. Com a sua equipa, libertou mais de 86.000 crianças do trabalho infantil e do tráfico humano, numa actividade de elevado risco pessoal. Em 98, organizou a Global March against Child Labour, que envolver 103 países para colocar na agenda a exigência do fim de todas as formas de trabalho infantil.


Tivemos a sorte de contar com a sua colaboração com um dos convidados especiais do Ubuntu United Nations 2021, em que inspirou os jovens líderes de todo o mundo que participaram nessa iniciativa. Mais tarde, na tomada de posse de José Ramos Horta como presidente de Timor-Leste, em Maio de 2022, tivemos a sorte de nos encontrarmos pessoalmente e de perceber a sua força de carácter e a bondade que o move. O seu exemplo - com certeza com defeitos também, como é próprio de humanos - é uma inspiração.


Um dos documentários que nos pode inspirar é “The price of free” (com legendas em português) em que se pode observar como desenvolve o seu trabalho.



A importância de começar pelo porquê


Nas nossas formações do método Ubuntu para formadores ou na Academia de Liderança Colaborativa, sublinhamos sempre, no domínio do autoconhecimento, a importância do “Círculo Dourado”, de Simon Sinek. Começar sempre pelo “porquê”/”para quê” é essencial para gerar sentido e propósito. Recupero, por isso, um dos exemplos que nos dava a propósito do primeiro voo.



(De “Primeiro pergunte porquê”, de Simon Sinek.)


“A meta era ambiciosa. O interesse público era elevado. Os especialistas estavam desejosos de contribuir. O dinheiro estava prontamente disponível. Munido de todos os ingredientes para o sucesso, Samuel Pierpont Langley determinou, em inícios da década de 1900, que seria o primeiro homem a pilotar um avião. Altamente conceituado, era um responsável de topo no Instituto Smithsonian, um professor de Matemática que também tinha lecionado em Harvard. Entre os seus amigos incluíam-se alguns dos mais poderosos homens a nível governamental e empresarial, incluindo Andrew Carnegie e Alexander Graham Bell. Langley recebeu uma dotação de 50.000 dólares do Departamento de Guerra dos EUA para financiar o seu projeto, uma avultada quantia de dinheiro para a época. Reuniu os melhores cérebros da época, uma verdadeira equipa de sonho em matéria de talento e conhecimentos. Langley e a sua equipa recorreram aos melhores materiais e a imprensa acompanhava-o para todo o lado. As pessoas em todo o país estavam de olhos postos na história, à espera de lerem que ele tinha alcançado o seu objetivo. Com a equipa que reuniu, e dispondo de amplos recursos, o seu sucesso estava garantido. Estava mesmo? A algumas centenas de quilómetros de distância, Wilbur e Orville Wright estavam a trabalhar na sua própria máquina voadora. A paixão de ambos por voar era de tal modo intensa que inspirou o entusiasmo e empenho de um grupo extremamente dedicado da sua terra natal, em Dayton, Ohio. Não havia financiamento para o empreendimento dos dois irmãos. Não dispunham de qualquer dotação governamental. Não possuíam contactos de alto nível. Nem uma só pessoa da equipa possuía habilitações académicas superiores, nem tão pouco Wilbur ou Orville Wright as tinham. Mas a equipa uniu-se numa humilde loja de venda de bicicletas e conseguiu tornar a sua visão numa realidade. No dia 17 de dezembro de 1903, um pequeno grupo testemunhou um homem a voar pela primeira vez na História. Como é que os irmãos Wright conseguiram ser bem-sucedidos numa área onde uma equipa com melhores equipamentos, mais bem financiada e com um nível de instrução superior não conseguiu? Não foi sorte. Tanto os irmãos Wright como Langley estavam altamente motivados. Ambos os lados tinham uma forte ética profissional. Ambos os lados dispunham de mentes científicas aguçadas. Eles estavam atrás do mesmo objetivo, mas apenas os irmãos Wright foram capazes de inspirar quem os rodeava e de liderarem verdadeiramente a sua equipa no sentido de desenvolverem uma tecnologia que mudaria o mundo. Só os irmãos Wright começaram pelo “porquê”.”



Educação 4.0: sabe o que é?


Cada vez é mais claro que o que importará para o futuro próximo em termos de competências, atitudes, valores e conhecimentos é muito diferente do passado recente. Isso constitui uma enorme responsabilidade para a Educação.



Em Janeiro deste ano, o World Economic Forum publicou um importante relatório, de leitura essencial para quem trabalha em Educação ou, ainda mais importante, para quem tem responsabilidades educativas.


Este relatório procura atualizar o conhecimento sobre o conjunto de competências mais relevantes para o desenvolvimento pessoal, bem como para o potencial de empregabilidade. Acrescenta, no entanto, com igual destaque, um conjunto de atitude e valores também decisivos, e termina com o destaque à dimensão do conhecimento e da informação. Esta estruturação, com este detalhe e proporcionalidade entre dimensões, vinda de uma estrutura (WEF) que se foca particularmente na economia (embora com uma leitura muito abrangente) é muito significativa. Não se trata, como alguns dirão, de “eduquês” ou do “politicamente correto”, mas de uma visão hiperpragmática do que contará cada vez mais.


(in Defining Education 4.0: A Taxonomy for the Future of Learning)

Nas conclusões do relatório sublinha-se, em relação aos Educadores, as seguintes conclusões:


  1. Sendo os professores os principais motores de aprendizagem, estes cumprem um papel fundamental na promoção e desenvolvimento da educação. A Taxonomia da Educação pode permitir que os professores alinhem mais as suas práticas com as expectativas futuras no local de trabalho para os seus estudantes.

  2. Ações específicas podem incluir:

  • A adaptação das práticas de ensino e aprendizagem, concentrando-se na promoção das competências educativas e explicando aos alunos e pais que estas competências serão fundamentais para a empregabilidade futura.

  • Adaptar os mecanismos de avaliação para que se concentre no acompanhamento do desenvolvimento destas competências.

  • Proporcionar oportunidades para que os estudantes observem como as competências da Educação são utilizadas no local de trabalho.


Importa ainda sublinhar que nesta dinâmica da chamada “Educação 4.0”, pretende “reimaginar a educação como uma experiência inclusiva, que decorre ao longo da vida, e que é da responsabilidade do sujeito “aprendente”, com os professores e mentores a agirem como facilitadores e conectores”.


Nesta dinâmica, surgem com grande destaque três dimensões: A capacidade de resolver problemas; a colaboração e a adaptabilidade.

(in Education 4.0: Here are 3 skills that students will need for the jobs of the future)


Ubuntu em revista: porque o conhecimento conta


Foi uma grande ousadia, mas valeu a pena. O sonho de criar uma revista de ciências sociais (e humanas) em torno do Ubuntu, com particular foco nas experiências da Academia de Líderes Ubuntu, em Portugal e no Mundo, concretizou-se com o primeiro número, lançado no Instituto Politécnico de Santarém. Se não pôde lá estar, já pode ter acesso à sua cópia digital, aqui.




(da Nota de Abertura da Revista Ubuntu)

"No domínio das metodologias inovadoras de educação há, tantas vezes, uma separação excessiva entre o trabalho de terreno e a produção de conhecimento teórico codificado, a partir dessa experiência, estruturada com o rigor científico que se exige nos standards de boas práticas de referência. Se se reconhece que, indiscutivelmente, muitos projetos educativos se baseiam em conhecimento de elevada qualidade, mais rara é, no entanto, a produção sistemática de novos contributos para a ciência a partir da prática dessas atividades. Haverá para isso razões ponderosas, desde a escassez de recursos alocados a estes projetos, que não permitem ir além da execução das atividades previstas, até à urgência da ação que não é compatível com os tempos da investigação científica, passando também pelas dificuldades de diálogo entre as “linguagens” da prática e da reflexão teórica. Acresce que, se isto é válido para dinâmicas de inovação na educação formal, ainda mais o é para projetos de educação não-formal, quase sempre “parente pobre” no mundo educativo, em termos de correlação com a investigação. Desde o seu início, a Academia de Líderes Ubuntu (ALU), definiu como prioridades relevantes, não só a robustez científica das fontes teóricas que enformam o seu método, como também afirmou a ambição progressiva de ir mais longe, através da capacidade de produzir conhecimento a partir da sua experiência. Não se intimidando por estar no domínio da educação não-formal, procurou constituir um Conselho Científico que acompanhasse, de uma forma sistemática e aprofundada, a dinâmica da sua ação. Contou para isso com a generosidade e a competência inexcedíveis dos seus coordenadores, Madalena Alarcão (Universidade de Coimbra) e José Luís Gonçalves (Escola Superior de Educação Paula Frassinetti), que tão bem dirigiram o esforço de orientar esta publicação, mas também com a riqueza dos contributos de cada um dos seus membros, numa diversidade de áreas científicas que proporcionou uma abordagem multidimensional do trabalho da ALU. A todos e a cada um dos membros deste Conselho, a nossa mais profunda gratidão. No seio deste Conselho foi-se desenvolvendo uma reflexão continuada ao longo dos anos, que foi ajudando, de uma forma muito significativa, a dar uma forma cada vez mais sofisticada à intervenção da ALU. Naturalmente, foram surgindo desafios de produção científica aplicada (como o que deu origem à obra “Pilares do Método Ubuntu”) ou ainda dinâmicas de reflexão coletiva como foi o caso do livro “Desafios da Educação em tempos de (pós)pandemia: o contributo Ubuntu”). Por outro lado, no decurso desse processo, foram nascendo diferentes pistas de investigação, muitas delas associadas à vontade de avaliar o impacto do método Ubuntu, para compreender melhor o que se experienciava na Academia. Isso permitiu identificar linhas de trabalho, definir termos de referência e acompanhar a execução de vários estudos, particularmente focados na experiência das Academias de Líderes Ubuntu nas Escolas. É deste enfoque que nasceu a ousadia de fundar uma revista científica, capaz de plasmar conhecimento produzido em torno das ALU, que represente um novo patamar neste processo virtuoso de uma prática que se teoriza e de teoria(s) que inspira(m) uma ação madura. Com o apoio sempre presente do Ministério da Educação, e em particular da Direção Geral de Educação, que muito agradecemos, surge então este primeiro número da revista Ubuntu. Aos autores dos textos que publicamos, expressamos a nossa imensa gratidão, bem como de igual modo reconhecemos à equipa do IPAV, liderada pela Tânia Neves, o enorme profissionalismo e competência com que assegurou que este projeto chegasse a bom porto. Inspirado, na forma e no conteúdo, pelo que deve ser uma revista científica, esta primeira edição da Ubuntu permite-nos continuar a dar passos cada vez mais seguros para uma ação frutífera, que não se esgota no instante em que acontece uma ALU. Sabemos hoje muito mais sobre o impacto do método Ubuntu, nomeadamente nas Escolas, mas como é próprio destes processos, também sabemos muito mais o que não sabemos e, claro, também não ignoramos que deve haver muito que não sabemos que não sabemos. É essa a maravilha da aventura do conhecimento. Por isso, para a agenda futura não faltam temas para investigar e vontade para publicar o que se for descobrindo e construindo. Este caminho só agora começou."

De estudantes a aprendentes


No sistema educativo sul-africano encontrei a utilização regular no discurso oficial a expressão “learner” em vez de “Student. Vale a pena pensar em todas as consequências dessa opção, pois não é uma mera questão de palavras.



Nesta minha recente viagem à África do Sul, confrontei-me com a utilização do termo “learner” em vez de “student”. Nunca me tinha cruzado com um discurso oficial que usasse esta nomenclatura, mas, pensando bem, faz todo o sentido.


Nos nossos Laboratórios da Mudança repetimos, muitas vezes, que o que importa é o foco nos resultados e nos impactos e não tanto na produção de outputs. Assim, parecendo tudo a mesma coisa - aluno, estudante e aprendente* - não o é. É diferente ir às aulas, estudar ou aprender. Apesar da (potencial e desejável) correlação entre estas dimensões, o que conta mesmo é o que se aprendeu. É bom estudar, mas só se for para aprender.


As palavras que usamos - ainda que possam ser sinónimos - têm um poder performativo, porque carregam consigo um determinado ângulo, um ênfase que pode ser diferente. Esta opção sul-africana é inovadora e inspiradora.


*Escolho propositadamente esta palavra, que raramente usamos (aprendente), como tradução de “learner” (em vez de aprendiz, que poderia ser outra opção, mas que habitualmente tem sempre um traço de desqualificação que queria evitar).



O Ubuntu vai cruzando fronteiras


Através de várias alianças temos ido mais longe na disseminação e partilha do projeto Ubuntu com outros países. O que está a acontecer com a colaboração com a África do Sul , com o projeto One Million Ubuntu Leaders é um exemplo disso mesmo. Também o que resulta da cooperação com a OEI - Organização dos Estados Iberoamericanos para o mundo latino-americano tem sido um espaço de crescimento. E assim vamos construindo pontes



Este mês tive a oportunidade de participar num momento muito especial na África do Sul. Viajei até Pretória, capital do país, para participar no lançamento oficial da iniciativa One million Ubuntu Leaders no Department of Basic Education (o correspondente ao nosso Ministério da Educação). Numa iniciativa conjunta entre várias organizações ligadas à educação, entre as quais se incluem a UNICEF, a MIET e o NECT, e depois dos primeiros pilotos realizados em várias escolas, é agora a vez de lançar com grande ambição um programa em larga escala.


Tendo recebido da África do Sul este presente chamado Ubuntu torna-se muito especial que possamos agora partilhar a nossa metodologia das Academias de Líderes Ubuntu com este grande país.




A Radio Exterior de Espanha, em parceria com a OEI, dedicou um programa ao projeto Escolas Ubuntu, procurando dar a conhecer esta abordagem para o desenvolvimento de competências socioemocionais, através da ética do cuidado, da construção de pontes e da liderança servidora.


Nesta mesma linha de desenvolvimento na América Latina, neste próximo mês de Maio teremos a alegria de lançar a Academia de Líderes Ubuntu quer no México, quer na República Dominicana, fazendo formação de formadores e aplicando as primeiras semanas Ubuntu nesses países.



Álbum do mês


A música é último reduto do sossego que procuramos. Sempre que se procura um canto que nos permita estar suficientemente afastado das inquietações quotidianas, a companhia de boa música ajuda muito. Por isso, em cada mês trarei também um álbum/músico que cumpra esse papel. Desta vez é The Boatman´s Call, de Nick Cave.



Este álbum de 1997 é precioso. Com uma toada suave, a que o piano e a voz grave de Cave dá um tom especial, esta incursão do autor por terrenos de uma fase pós-punk, com sonoridades muito diferentes de outros tempos, é memorável.


Vá então até à Apple Music ou ao Spotify (ou mesmo ao Youtube) e desfrute desta companhia. Da minha parte, sugiro que o tema “Into My Arms” sirva de paisagem sonora durante o tempo necessário para respirar fundo.



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